Plano de saúde de custear tratamento médico domiciliar (home care). Cobertura pelo serviço tem sido garantida pelo tribunais de todo país.

O exercício da advocacia costuma nos colocar sempre ao lado das pessoas em momentos delicados de suas vidas, e por tal, acho que nós advogados que trabalhamos na defesa de direitos de cidadania aprendemos a valorizar as pequenas coisas e mitigar qualquer pequeno problema,  pois todo dia na nossa labuta cruzamos com pessoas enfrentando dificuldades que nos fazem colocar em perspectiva os pequenos aborrecimentos da vida.

As dificuldades que nossos clientes enfrentam são de todas as esferas, mas talvez nenhuma seja mais impactante do que as que envolvam a saúde, pois quando esta se cruza com o direito significa que uma pessoa além de estar enfrentando estes problemas ainda esta tendo de batalhar contra a burocracia e negativas de planos de saúde e do governo para ter acesso aos seus tratamentos.

O que vamos contar aqui é a história de uma senhora, que após ter sofrido uma AVC necessitava de acompanhamento por enfermeiros em sua casa, no entanto o Plano de Saúde se negava a pagar afirmando que não existia esta cobertura, diante de negativa uma de suas filhas buscou ajuda jurídica questionando se o plano deveria pagar ou não os cuidadores.

Diante da situação foi ajuizada uma ação exigindo o custeio do Home Care, mas esta foi julgada improcedente em primeira instância, aumentando o calvário dos clientes do plano e obrigado o advogado a recorrer para a segunda instância, onde então se conseguiu  modificar a decisão garantindo o direito para a  cliente em segundo grau conforme os termos do acórdão que segue condendou o plano de saúde a pagar o home care.

APELAÇÃO CÍVEL (70077802767). PLANO DE SAÚDE. julgado do STJ - REsp nº 1.378.707. HOME CARE. DESDOBRAMENTO DA INTERNAÇÃO. POSSIBILIDADE. Determinação de prestação do serviço de home care. Observação dos termos da prescrição do médico assistente. O home care, quando prescrito pelo médico assistente, deve ser custeado pelo plano de saúde.

Apelo do autor provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos. 

Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des. Luís Augusto Coelho Braga (Presidente) e Des. Niwton Carpes da Silva.

Porto Alegre, 16 de agosto de 2018.

 

RELATÓRIO

Des.ª Elisa Carpim Corrêa (RELATORA)

Sr. X, qualificado, representado por Sra X, ajuizou AÇÃO COMINATÓRIA em face de GEAP – AUTOGESTÃO EM SAÚDE, igualmente qualificado, argumentando ter a parte contrária obrigação no fornecimento de tratamento domiciliar, consistente em serviço de home care, com acompanhamento de enfermeiros 24h por dia e fornecimento de todos os medicamentos e exames necessários ao seu tratamento.

Narrou que sofreu um AVC e, desde então, encontra-se impossibilitado de exercer os atos da vida civil, estando acamado, sem possibilidade de locomoção. Disse ter disfagia neurogênica e afasia severa, bem como traqueostomia, necessitando de fraldas geriátricas e alimentação enteral por gastrostomia.

Alegou que necessita de acompanhamento constante, diante de seu quadro de saúde e da insuficiência de leitos. Referiu ter a parte contrária negado, contudo, a cobertura do tratamento domiciliar (home care), sem justificativa plausível, mesmo que ausente qualquer exclusão expressa no contrato firmado sobre internação domiciliar.

Requereu a concessão de tutela antecipada, a fim de que o demandado disponibilizasse o serviço de home care, com acompanhamento de enfermeiros 24h e fornecimento de todos os medicamentos, aparelhos, instrumentos e exames necessários ao seu tratamento, nos termos da prescrição médica, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00.

Postulou a confirmação da medida antecipatória, bem como a concessão do benefício da gratuidade da justiça e da tramitação preferencial. Deu à causa o valor de R$ 1.388,00. Juntou documentos, fls. 15-60.

Deferiu-se a gratuidade judiciária e a antecipação dos efeitos da tutela, determinando-se a inversão do ônus da prova, fls. 61-62.

Da decisão que deferiu a antecipação de tutela, a parte-ré interpôs agravo de instrumento, fls. 74-93, e anexou documentos, fls. 94-132.

Citado, o demandado apresentou contestação. Em preliminar, impugnou a concessão da gratuidade da justiça ao autor, bem como teceu comentários sobre a sua natureza e finalidade, relatando ser uma entidade de autogestão, que atua em favor de seus associados, fundamento pelo qual descabe a aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

No mérito, afirmou ter respeitado a legislação aplicável ao caso, não tendo o autor direito ao tratamento pretendido, diante do que preceitua o Regulamento e a Norma Técnica do Plano, razão pela qual não cometeu qualquer ato ilícito. Referiu, ainda, que o demandante está inscrito no Programa de Gerenciamento de Casos, que tem por finalidade o acompanhamento, em domicílio, dos beneficiários portadores de doenças crônicas não transmissíveis, em condição de dependência, com acompanhamento de equipe multiprofissional.

Aduziu que o benefício do tratamento home care em cada tipo de convênio é fornecido por mera liberalidade, não havendo qualquer norma que obrigue a prestação de tal serviço, principalmente considerando que não é essencial e urgente. Disse não haver provas de que a negativa de cobertura tenha acarretado danos morais ao requerente.

Pediu o acolhimento das preliminares e, caso contrário, a total improcedência dos pedidos. Anexou documentos, fls. 153-321.

O autor apresentou manifestação, informando o não cumprimento da medida antecipatória concedida e requerendo fosse o réu compelido a cumprir a determinação judicial, deferindo-se a realização de penhora nas contas da adversa, nos valores de R$ 4.080,00 e R$ 2.040,00, ou a condenação do demandado ao pagamento de tal montante, bem como do valor de R$ 24.480,00, para que fosse disponibilizado em caso de descumprimento da medida, fls. 322-323. Juntou documentos, fls. 324-327.

Concedeu-se efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto pela parte-ré, fls. 328-330.

Deu-se provimento ao agravo de instrumento interposto, fls. 333-342, do qual foi interposto recurso especial, não conhecido pelo Superior Tribunal de Justiça, fls. 343-381.

Houve réplica.

Intimadas quanto ao interesse na produção de novas provas, fl. 387, o réu postulou a produção de prova pericial, fls. 389-390, o que foi deferido, fl.  396.

O demandado anexou documentos às fls. 425-468.

Anexou-se laudo pericial, fls. 481-497, dando-se vista às partes.

Deu-se vista ao Ministério Público, fl. 506, que apresentou parecer, opinando pela procedência, fls. 507-516, tendo vista as partes.

Sobreveio sentença, nos seguintes termos: 

ISSO POSTO, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS, FORTE NO ARTIGO 487, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

OUTROSSIM, CONDENO O AUTOR A PAGAR AS CUSTAS PROCESSUAIS, HONORÁRIOS PERICIAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS AO PATRONO DA PARTE-DEMANDADA, QUE FIXO EM R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS), COM CORREÇÃO MONETÁRIA, PELO IGPM, A CONTAR DESTA DATA, E JUROS LEGAIS, A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO, COM FULCRO NO ARTIGO 85, § 8º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, OBSERVADO O TRABALHO DESENVOLVIDO E A COMPLEXIDADE DA CAUSA, ALÉM DO LONGO TEMPO DE TRÂMITE EM PRIMEIRO GRAU, CUJA EXIGIBILIDADE FICA SUSPENSA, ANTE O BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA.

A parte autora apelou (fls. 531/537). Em suas razões, disse que é perfeitamente aplicável à espécie o diploma consumerista, por força da súmula n° 469 do STJ. Sustentou que o tratamento por home care deve ser entendido como desdobramento da internação hospitalar, merecendo, portanto, cobertura do plano e não podendo ser limitado.

A apelada apresentou suas contrarrazões ao recurso.

A Procuradora de Justiça opinou pelo total provimento do recurso.

É o relatório.

VOTOS

Des.ª Elisa Carpim Corrêa (RELATORA)

Preenchidos os pressupostos e requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Ao analisar os documentos insertos nos autos, constata-se serem aplicáveis ao caso em exame as exigências mínimas previstas no plano-referência de que trata os artigos 10 e 12 da legislação dos planos de saúde.

Assim, o inciso II, “b” do artigo 12 do diploma legal precitado, estabelece que constitui exigência mínima dos planos a cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente.

Constata-se pelos documentos carreados ao feito a necessidade do tratamento domiciliar postulado, tendo em vista que a parte autora sofreu um Acidente Vascular Cerebral grave, com disfagia neurogênica, afasia severa, hipertensão crônica, epilepsia, taqueostomia e gastronomia (fl488). Portanto, necessitando de equipamentos para sua alimentação e respiração, bem como acompanhamento por enfermeiro em tempo integral, conforme consta do laudo pericial de fls. 496.

Cumpre ressaltar que não cabe à demandada determinar o tipo de tratamento que será realizado pela parte autora, uma vez que esta decisão cabe ao médico que a acompanha, que no caso indicou o tratamento domiciliar por ser o mais adequado às condições da demandante. 

Assim, descabida a negativa securitária sob a alegação de que não há cobertura contratual para tratamento domiciliar, pois o que importa para a solução do litígio é a existência de cobertura securitária para a patologia apresentada, e não a forma como o tratamento deverá ser ministrado.

A Resolução Resolução Normativa 387/2015, aplicável ao caso, que atualizou o rol de procedimentos e eventos em saúde de alta complexidade, que constitui referência básica, definida para fins de cobertura mínima e obrigatória.

Por certo que o rol de eventos e procedimentos listados nos anexos da Resolução Normativa não são exaustivos, tanto que sistematicamente são reavaliados pela ANS.

O que pede a parte autora é a cobertura de terapias, no momento, essenciais para sua reabilitação das habilidades perdidas, listadas e fundamentadas pelos laudos de médicos assistentes.

De outro lado, os planos de saúde apenas podem estabelecer para quais moléstias oferecerão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, incumbência essa que pertence ao profissional da medicina que assiste o paciente. 

Em recente julgamento, REsp nº 1.378.707, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou o entendimento de que o home care, quando prescrito pelo médico assistente, deve ser custeado pelo plano de saúde, em precedente assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. SERVIÇO DE HOME CARE. COBERTURA PELO PLANO DE SAÚDE. DANO MORAL.

1 - Polêmica em torna da cobertura por plano de saúde do serviço de "home care" para paciente portador de doença pulmonar obstrutiva crônica.

2 - O serviço de "home care" (tratamento domiciliar) constitui desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto que não pode ser limitado pela operadora do plano de saúde.

3- Na dúvida, a interpretação das cláusulas dos contratos de adesão deve ser feita da forma mais favorável ao consumidor. Inteligência do enunciado normativo do art. 47 do CDC. Doutrina e jurisprudência do STJ acerca do tema.

4- Ressalva no sentido de que, nos contratos de plano de saúde sem contratação específica, o serviço de internação domiciliar (home care) pode ser utilizado em substituição à internação hospitalar, desde que observados certos requisitos como a indicação do médico assistente, a concordância do paciente e a não afetação do equilíbrio contratual nas hipóteses em que o custo do atendimento domiciliar por dia supera o custo diário em hospital. 

5 - Dano moral reconhecido pelas instâncias de origem. Súmula 07/STJ.

6 - RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 

Nesse sentido, também já julgou este órgão fracionário:

Apelação cível. Seguros. Plano de saúde. Determinação de prestação do serviço de home care. Reconhecimento de abusividade da cláusula que limita o fornecimento de dieta enteral e serviço de fonoaudiologia e fisioterapia. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de seguro. Observação dos termos da prescrição do médico assistente. O home care, quando prescrito pelo médico assistente, deve ser custeado pelo plano de saúde. Orientação contida em recente julgado do STJ - REsp nº 1.378.707. Redução da verba honorária. Apelação parcialmente provida. (Apelação Cível Nº 70069903664, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em 29/09/2016)

No caso em exame, restou devidamente demonstrada a necessidade dos tratamentos postulados, inclusive na residência do autor, conforme a vasta documentação acostada junto à exordial, em que o médico assistente ressaltou a gravidade do estado de saúde do autor em razão do AVC sofrido.

Diante do exposto, voto por dar provimento ao apelo, ao efeito de julgar totalmente procedente a ação, determinando o custeio integral do tratamento do autor pela Operadora do plano. Sucumbente, arcará a ré com a totalidade das custas processuais e honorários de advogado fixados pela sentença.

Des. Niwton Carpes da Silva - De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Luís Augusto Coelho Braga (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA - Presidente - Apelação Cível nº 70077802767, Comarca de Porto Alegre: "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO."

Julgador(a) de 1º Grau: FERNANDA CARRAVETTA VILANDE

 

Home Care um Direito

Como se verifica o atendimento domiciliar é um direito do paciente, logo quem tiver este direito negado deve procurar ajuda jurídica.

Passo a Passo - O que fazer em caso de negativa de cobertura pelo plano de saúde?

A primeira coisa é solicitar ao médico do paciente que ateste a necessidade do tratamento domiciliar através de um documento onde conste de forme bem detalhada qual a doença, o CID, o porque da necessidade, e quais os equipamentos e profissionais necessários para atender o paciente. Cabe colocar ainda, quais os materiais de uso contínuo e frequência de visita dos profissionais ao local.

Com este documento em mãos o familiar deve procurar a operadora do plano de saúde e solicitar o home care.

Caso exista negativa, a única saída do paciente será buscar ajuda jurídica com um advogado de sua confiança.

O advogado irá analisar o caso e então interpor um ação judicial solicitando imediatamente uma antecipação de tutela (liminar) para que o plano passe a pagar.

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